quinta-feira, 15 de abril de 2010

Numeração táctica, aritmética ou aleatória.

A forma personalizada como actualmente os futebolistas são identificados, não só pela numeração, que conservam ao longo da época, mas também pelo próprio nome que ostentam nas costas, poderá ter muito a ver com o “marketing” e com a venda de camisolas mas, pouco ou nada, com a posição que ocupam no terreno de jogo e muito menos com o sistema táctico escolhido, pelo treinador.
Recorde-se que, a primeira vez que os jogadores alinharam com números nas camisolas aconteceu no Mundial de Futebol, disputado na Suíça, em 1954, e resultou de todo um processo evolutivo, relacionado com os espaços que os futebolistas vinham ocupando ao longo dos tempos, derivado do aperfeiçoamento táctico e estratégico do próprio jogo, em si.
Nos primeiros tempos do futebol, as equipas eram, regra geral, compostas por dez elementos, todos atacantes, e um jogador quase espectador, cuja missão consistia em observar a eventual passagem da bola entre os postes da baliza. Era, pois, natural que, nessa época, as equipas utilizassem apenas uma estratégia ofensiva, sem grandes preocupações em defender e proteger a zona mais recuada. O estratagema a seguir era sempre o mesmo: despachar a bola para a frente com pontapés compridos, a cair sobre a baliza adversária, com o propósito de marcar golos.
Com o aparecimento das tácticas e à medida que o jogo se foi enraizando nos hábitos dos ingleses, a preocupação defensiva fez a sua aparição e os jogadores começaram a recorrer a combinações de passes para bater as defesas adversárias. O guarda-redes foi integrado na equipa e, com o elemento defensivo a tomar cada vez maior ascendente, dois jogadores desapareceram do ataque e instalaram-se diante do “keeper”. A inovação, para além da colocação dos dois defensores, introduzia também dois médios, deixando os restantes seis homens mais adiantados.
Mais tarde, a fórmula foi modificada e a táctica, conhecida por “Sistema Clássico”, passou a ser executada por um guarda-redes, dois defesas, três médios e cinco avançados.
Tudo isto se passou numa época onde os futebolistas eram apenas distinguidos pela cor dos seus equipamentos, não se prevendo a introdução nem a obrigatoriedade da utilização numérica nas camisolas das agremiações que representavam.
Com o desenvolvimento e projecção que o futebol foi atingindo, alguns clubes sentiram necessidade de inovar e modernizar-se, começando por fornecer aos seus futebolistas equipamentos com as principais cores do clube e estampado, nas costas, os números de 1 a 11.
As equipas eram organizadas e iniciadas a partir do guarda-redes, que vestia a camisola com o nº 1. Aos dois defesas estavam destinados o nºs 2 e 3. No centro do terreno, e dando seguimento à numeração aritmética, os três médios eram identificados pelo nº 4 (médio-direito), nº 5 (médio-centro) e nº 6 (médio-esquerdo). Os avançados alinhavam com o nº 7 (extremo-direito), o nº 8 (interior-direito), o nº 9 (avançado-centro), o nº 10 (interior-esquerdo) e nº 11 (extremo-esquerdo).
Contudo, e com a alteração da lei do fora-de-jogo, e a exigência de que o atacante tivesse dois adversários entre ele e a linha de baliza, assistiu-se a nova alteração táctica, com o recuo do médio-centro, para a missão de “marcação” ao principal goleador adversário. Também os dois interiores passaram a jogar mais recuados, em missão de apoio e “alimentação” do avançado posicionado “em cunha”.
Esta disposição, esquemática, criada por Herbert Chapmann e conhecida por “WM”, vigorou durante quase três décadas, onde o “W” era constituído pelos três defesas e pelos dois médios mais recuados, e o “M” formado por dois interiores e pelos três avançados (dois extremos e um avançado-centro).
Refira-se que, em 1961, o Benfica de Béla Gutmann venceu a sua primeira Taça dos Campeões Europeus, frente ao Barcelona, utilizando uma táctica em tudo semelhante ao “WM”. Esta táctica só seria abandonada quando as equipas húngaras passaram a adoptar o 4-2-4, limitando o número de avançados a quatro elementos, para reforço da defesa, que passou também a dispor de quatro homens, recuando o médio-de-cobertura (nº 6) para fazer de “duplo stopper” com o defesa-central (nº 3), em tarefas de marcação aos elementos adversários, mais avançados.
Esta interpretação táctica foi seguida pelo Sporting, numa brilhante campanha, que levaria o clube de Alvalade à conquista da Taça das Taças, em 1964. De facto, os leões, comandados por Anselmo Fernandez, em várias ocasiões, fizeram uso de um esquema táctico que “oscilava” entre o 4-2-4 e o 4-3-3 ofensivo, consoante o adversário a defrontar. Por vezes, era o médio Péridis que desempenhava as funções de ala-direito. Outras, e sempre que era necessário dar um cariz mais atacante ao jogo da equipa, era Osvaldo Silva que “descaía” sobre o flanco direito, passando Mascarenhas a formar a dupla atacante com Figueiredo.
Com o andar do tempo, mais se observou a afirmação das concepções defensivas muito preocupadas em ocupar a zona central do terreno, com os técnicos a imporem a tendência de fazer alinhar as equipas em 4-4-2 ou num 4-3-3 mais ou menos rígido. Ou seja, quatro jogadores asseguram a defesa, quatro ou três, consoante o sistema, o meio-campo e dois ou três restantes os movimentos atacantes. Como consequência disso, nas décadas de 70 e 80, do século passado, alguns dos principais clubes de futebol, passaram a escolher uma lógica de numeração baseada na sequência puramente aritmética. Os elementos do quarteto defensivo envergavam as camisolas com o nº 2, 3, 4 e 5, aos centrocampistas estavam destinadas as camisolas 6, 7 e 8, e os homens do ataque vestiam, o 9, 10 e 11.
Por vezes, quando da adopção do 4-4-2, sistema baseado numa defesa de quatro elementos protegidos por quatro médios, a numeração seguia um método mais requintado, e os médios-alas apareciam a jogar com o nº 7 e nº 11, sendo destinados aos médios-centro os nº 6 e nº 8 e ao duo atacante as referências 9 e 10.
Hoje em dia, embora se continue a respeitar os condicionalismos da aplicação das regras do próprio jogo, da táctica e da estratégia predefinidas, desde que os futebolistas passaram a ser identificados por uma numeração aleatória, que varia entre o nº 1 e o nº 99, só por manifesta coincidência se relaciona o número “cravado” na camisola com o sistema táctico ou a sua disposição no terreno de jogo, contrariamente ao que verificou, durante a maioria das temporadas futebolísticas, do século passado.

sexta-feira, 2 de abril de 2010

SLB - XIII-IX-MCMVIII

Prometi a mim próprio não voltar a abordar o tema, não só por parecer que se trata de um obsessão clubista mas, principalmente, para não “bater mais no ceguinho” (leia-se benfiquista). Contudo, e em face de uma entrevista concedida por Luis Vieira, antigo jogador e um dos fundadores do Benfica, publicada no Boletim Informativo e de Divulgação da A.F.L., de Abril de 1965, há pouco chegada às minhas mãos, onde tão respeitável benfiquista acaba por confirmar a posição defendida no “post”, publicado neste blog em 28 de Fevereiro de 2008, que criou algum desconforto nos adeptos encarnados, resolvi voltar ao assunto.
Segundo Luís Vieira, benfiquista assumido e “back” no Grupo Sport Lisboa, em 1906, a maioria dos futebolistas que formavam o primeiro «team» resolveram ingressar num clube que estava em formação para as bandas do Campo Grande e ao qual foi dado o nome de Sporting Clube de Portugal. Essa deserção resultou de o Sport Lisboa não ter condições de vida, dado que não possuía nem campo nem sede. Assim, em 1907, o Sport Lisboa foi extinto pelos próprios elementos que o tinham originado, em 28-02-1904, resolvendo tomar novos rumos, tendo alguns dos fundadores do Grupo Sport Lisboa ingressado no Sporting, como os manos Rosa Rodrigues, conhecidos por “catataus”. O próprio Cosme Damião só depois de ingressar no Sporting, e por estar aborrecido por o não colocarem a jogar no primeiro “team” leonino, dispôs-se a fazer ressurgir o Sport Lisboa.
O tempo foi passando e como as dificuldades se mantivessem, pois continuavam a não ter campo para jogar, começaram a frequentar um terreno que existia em Benfica e que era propriedade do Grupo Sport Benfica, fundado em 26-07-1906. A convivência foi ditando amizades profundas, pelo que começou a frutificar de parte a parte a ideia de uma fusão, atendendo a que, o Sport Benfica, grupo que dedicava maior entusiasmo ao ciclismo e ao pedestrianismo, possuía um campo mas não tinha uma boa equipa de futebol. Deste modo, quase sem se dar por isso, a junção surgiu sem atritos e com a unânime aprovação de ambos os grupos, em 13 de Setembro de 1908, nascia o Sport Lisboa e Benfica.
Na opinião do antigo jogador e ilustre fundador, à época sócio nº 1 do clube da Luz, o Sporting é mais antigo que o Benfica, em virtude de não se ter verificado uma integração mas sim uma fusão, entre o GSL e o GSB.