Existe um ditado que diz: «Quando o leão está ferido, até o burro lhe dá coices».
A situação de intranquilidade e de
ansiedade que vive, presentemente, a equipa de futebol do Sporting, tem sido
motivo de debates de “paineleiros”, bem como o objecto predilecto de alguns
artigos de opinião, que pouco têm contribuído para alterar a situação de
instabilidade que teima em abandonar o “reino do leão”.
Como quase todos os “analistas
desportivos” lêem na mesma “cartilha”, não é difícil atribuir as causas da
crise, à ausência de um “projecto” ou de um “plano estratégico”, concluindo,
quase sempre, com a estafada frase: «o futuro do Sporting está na Academia».
Comecemos pelos “planos estratégicos” e “projectos”
a médio ou a longo prazo.
Um clube com o historial do Sporting,
que tenha como objectivo principal a conquista de títulos, qualquer planeamento
ou projecto, a implementar, passará sempre por vencer todos os jogos em
disputa, independentemente do local onde os encontros se realizam ou do
adversário a enfrentar. Os planos, esquemas, projectos ou programas podem ser
muito bem idealizados, concebidos ou implementados que, se não conduzirem ao
cumprimento dos objectivos previstos, que no futebol são convertidos em
vitórias imediatas, pouco representarão para o clube e para os seus apoiantes.
Recordando o passado e voltando à época
dos “violinos”, onde o Sporting venceu sete campeonatos nacionais em oito
possíveis, é fácil afirmar que o “projecto” resultou na plenitude, pelo menos
até 1954, ano a partir do qual o clube de Alvalade, com o mesmo “projecto”, com
a mesma filosofia dirigente e até com melhores instalações desportivas, deixou
de vencer campeonatos nacionais, com a mesma frequência.
O “projecto leonino” era o mesmo, só que
os futebolistas e os técnicos, que se seguiram, eram outros. Se acrescentarmos,
a isto, o aparecimento de uma poderosa equipa do Benfica, concebida por Otto
Glória, estabilizada pela “velha raposa” Bela Guttmann e reforçada por um dos
melhores futebolistas mundiais, de nome Eusébio, poder-se-á concluir que,
talvez não tenha sido tão mau conquistar campeonatos de 4 em 4 anos.
Vencer o Nacional, em 1954, 1958, 1962,
1966, 1970 e 1974 e atribuir os êxitos a hipotéticos “planos” e “projectos
estratégicos” é pura ingenuidade e ilusão, uma vez que, no ano seguinte, a
estratégia mantinha-se, as equipas eram reforçadas e o “treinador campeão” continuava
o seu percurso, até os resultados começarem a ser adversos.
Nos finais da década de setenta, do
século passado, despontou o FC Porto, pela mão de Pedroto, coadjuvado por Jorge
Nuno Pinto da Costa, e o Sporting começou a fazer a sua travessia no deserto.
Quando os futebolistas possuem limitadas
capacidades, os técnicos não evidenciam a mínima categoria e perspicácia para o
lugar que desempenham e os dirigentes pouco entendem das atribuições para as
quais foram eleitos, poderemos teorizar sobre “projectos e mais projectos” que
os resultados só surgirão por milagre.
Confirmando a posição até aqui defendida,
encontra-se a conquista do campeonato nacional, na época 1999/2000, após 18
anos a investir em equipas dispendiosas, planos infalíveis, esquemas eficazes,
programas seguros, projectos estratégicos, novos dirigentes, eternos adeptos,
estruturas sofisticadas, etc. Mas Augusto Inácio chegou em Outubro, sem grande
curriculum, com a época iniciada pelo “projecto” de Giuseppe Materazzi,
entretanto afastado, escolheu a táctica e a estratégia a adoptar, colocou os
futebolistas nas posições mais aconselháveis e…….foi campeão. Onde estava o
“projecto” do Inácio e “organização estrutural” dos dirigentes? Apenas
escolheram a pessoa certa para comandar jogadores que, não sendo de “primeira
água”, possuíam as condições técnicas suficientes para, com empenho e
mentalidade ganhadora, levarem o Sporting ao título.
Em 2002, poderia o técnico Lazlo Boloni
referir que o “seu plano” resultou em pleno e a sua concepção de jogo também, mas
se não fosse a categoria e experiência de alguns elementos que compunham o plantel
(Ex.: João Pinto, André Cruz, Paulo Bento, Rui Jorge; Rui Bento, Babb, Pedro
Barbosa, etc.) e, fundamentalmente, a excepcional capacidade concretizadora de
Mário Jardel e o “projecto” de Boloni e da direcção, não teria resultado.
No ano seguinte, com a direcção
consolidada, com o mesmo técnico e a sua planificação e estratégia de
treinamento, com a equipa reforçada e com Ricardo Quaresma e Cristiano Ronaldo
a afirmarem-se com brilhantes desempenhos, a equipa leonina não conseguiu
melhor que o terceiro posto na classificação.
Pois é! O “projecto” e o “plano” eram
bons só que não contaram com os problemas originados por Jardel e o pelo seu
empresário e com a falta de perspicácia de Boloni na abordagem à situação
criada. O Bota de Ouro pouco jogou, os golos não apareceram e a classificação final
ficou aquém do esperado.
Quase todos os
comentadores referem que, o Sporting, para voltar a ressurgir terá de criar
alicerces, suficientemente fortes e suportando o seu futebol na Academia e na Equipa
B. Estranha-se que, a solução preconizada, pelos “experts” para “salvar” o
Sporting não seja também aplicável ao FC Porto e ao Benfica, em virtude das
equipas dos rivais directos serem constituídas, na quase totalidade, por
futebolistas estrangeiros, à excepção de João Moutinho e Silvestre Varela, no
FCP e de Carlos Martins, no SLB, por sinal formados na Academia de Alcochete.
O Sporting terá de apostar,
convictamente, na sua Academia e na respectiva formação de jogadores, mas não
com os pressupostos com que o tem feito. Não é admissível que, o elevado
investimento realizado, ao longo dos últimos anos, não tenha tido contrapartida
desportiva e retorno financeiro, adequados. Sendo inegável que, a Academia tem
sido um alforge de futebolistas, também é verdade que um número reduzido tem
sido aproveitado pelo clube. De facto, existem algumas pechas que têm de ser
rectificadas, sob pena de se continuar a perder tempo e dinheiro.
Da Academia, nos últimos tempos, têm
saído bons futebolistas mas um observador mais atento detectará algumas
similaridades nas suas qualidades e defeitos. As características de André
Martins são muito semelhantes às de André Santos e de Adrien, seguindo a mesma
linha evidenciada por João Moutinho, mas de nível inferior. Também as
particularidades físicas e técnicas patenteadas pelos defesas-centrais, Tiago
Ilori, Pedro Santos e Tobias Figueiredo, não diferem muito das de Daniel
Carriço ou Nuno Reis. Por outras palavras: a Academia forma futebolistas “quase
iguais” e de nível mediano, notando-se a ausência de avançados, dignos de
menção.
Possuindo o Sporting uma Academia com óptimas
infra-estruturas, elogiadas por muitos, com o apoio de técnicos de reconhecida
capacidade, torna-se incompreensível o fraco grau de aproveitamento de
futebolistas para a equipa principal, optando a actual política do clube por
reforçar o plantel principal com jogadores jovens, inexperientes, oriundos de vários
países (Ex.: Labyad, Arias, Viola, Carrillo, Van Wolfswinke, etc.).
Por outro lado, a directoria de Godinho
Lopes, Luís Duque e Carlos Freitas, em dois anos de mandato despenderam,
aproximadamente, 75 mil euros em duas dezenas de futebolistas que, juntamente,
com a incompreensível opção por Sá Pinto, conduziram o clube de Alvalade à
dramática situação em que se encontra, presentemente.
Também, a Equipa B, com o brilhante
desempenho que tem tido na segunda Liga, poderia funcionar não só para rodar
jovens futebolistas, saídos da formação, mas principalmente como municiador de
jogadores para a equipa principal. Para tal teria, forçosamente, de adoptar uma
estratégia e estrutura táctica semelhante à da principal equipa, para que os
futebolistas, estivessem familiarizados com as posições tácticas bem definidas e
se encaixassem na perfeição, quando chamados à Equipa A. Com a alternância de
treinadores, quer numa equipa quer noutra, e sem um “fio de jogo”, previamente
definido, e a utilizar em todos os escalões, dificilmente a chamada de algum
jovem jogador poderá ter êxito, a curto prazo, excepção feita à linha defensiva.
Nos últimos anos, também, a aposta em
treinadores nacionais não se tem mostrado eficaz. De facto, contratar técnicos com
poucas provas dadas e com fraco curriculum (Ex.: Paulo Sérgio, Carvalhal,
Couceiro, Sá Pinto), não tem sido uma solução feliz. Talvez o desempenho de
Paulo Bento seja, em parte, a excepção. O próprio Paulo Bento poderia ter
atingido outros patamares de êxito se o seu excesso de autoritarismo, em
determinados momentos, não o tivesse conduzido a situações pouco aconselháveis num
“condutor de personalidades”. Por outro lado, enquanto treinador leonino, Paulo
Bento tomou algumas decisões discutíveis, entre as quais se realça a dispensa
de Silvestre Varela e o veto ao regresso de Hugo Viana, jogadores formados na
Academia leonina, por não se “encaixarem” na estratégia e no esquema táctico
escolhido. Contudo, como seleccionador os referidos futebolistas foram por
diversas vezes convocados e, inclusive, Varela é frequentemente utilizado, na
selecção, como arma secreta, quando a equipa das quinas evidencia dificuldades
na concretização.
Até esta data, a contratação de Frank
Vercauteren pouco acrescentou à equipa de futebol, em termos exibicionais e de
resultados, tendo o técnico aproveitado os dois jogos já disputados para testar
alguns futebolistas e proceder a algumas experiências e alterações que, reflectem
um desconhecimento evidente do plantel. O desempenho de Capel, frente ao Genk,
mostrou que nunca poderia ter ficado no banco, em Setúbal. Tirar Rinaudo, do
encontro com o Genk, para meter Gelson Fernandes, não é compreensível. Insistir
em Labyad e Viola em detrimento de Izmailov e Carrillo, não parece aceitável.
Apostar, nos minutos finais no jogo com o Genk, em três centrais com a entrada
do jovem e inexperiente Ilori com o adversário a pressionar, procurando o
empate a todo o custo, foi completamente desaconselhável.
Quando Vercauteren se aperceber de que o
plantel actual possui pouco mais que uma dúzia de elementos, com qualidade para
jogar na equipa principal, talvez comece a ganhar jogos.
A presente época está, praticamente,
condenada e, provavelmente, não merecerá o investimento e o reforço da equipa,
com um avançado-centro e um armador de jogo, no mercado de inverno, lacunas
evidentes no grupo de trabalho e que tornariam a equipa mais competitiva.