quarta-feira, 4 de novembro de 2009

O "losango" segundo Jesus

As leis que regem o futebol estabelecem que o jogo é praticado por onze jogadores de cada lado e que um deles, chamado de guarda-redes e equipado de maneira diferente, goza da prerrogativa especial de poder jogar com as mãos, dentro da grande-área. As mesmas leis nada referem relativamente ao posicionamento dos jogadores no terreno de jogo, à existência de defesas, médios ou avançados, nem ao modo como se joga, pelo chão ou pelo ar, em passe curto ou em passe longo, nem às movimentações defensivas ou ofensivas.
Não é possível passar ao lado da evolução estratégica do futebol, sem abordar o seu elemento fundamental: a colocação dos jogadores no terreno de jogo. Progressivamente, “arrumar” os futebolistas provocou o desaparecimento do jogo instintivo e desconexo e fortaleceu o entendimento entre os seus elementos desenvolvendo o espírito de equipa.
Ao longo dos anos, e fruto da imaginação e experiência dos técnicos do futebol, foram sido criadas as tácticas e surgiram os “sistemas de jogo”, ajustados tanto às características dos futebolistas que compõem a equipa como às características do adversário que defrontam.
Pode dar-se liberdade e valorizar as iniciativas individuais dos futebolistas, mas a estratégia e a forma como os jogadores se combinam e associam e participam no trabalho de conjunto tem de existir em todas as equipas, sob pena de o futebol praticado se transformar numa anarquia de esforços descontrolados, de pontapé para a frente e de correrias desenfreadas. Sem técnica, nem táctica de jogo, sem princípios reguladores da utilização dos futebolistas, na manobra defesa-ataque, não podem existir grandes espectáculos e dificilmente se “chegará” ao golo.
Assim, não é de estranhar que, as “linhas-mestras”, que suportam a formação e estruturação de uma equipa de futebol, minimamente competitiva, assentem na escolha táctica, na estratégia e, logicamente, na qualidade dos futebolistas que a compõem.
Muitos técnicos portugueses, onde se incluem os treinadores dos dois principais rivais da capital, Paulo Bento e Jorge Jesus, fazem da utilização do 4-4-2, em losango, constituído por quatro centro-campistas colocados nos vértices de um losango imaginário, que avança e recua à medida que surgem adversários, o “modelo táctico” predilecto e a almejada chave para alcançar êxitos.
Como só por si, a escolha da “táctica do losango” não é, sinónimo de sucesso, a presente época na Liga tem mostrado como o Sporting e o Benfica conseguem resultados tão díspares, que os têm afastado na tabela classificativa.
O treinador Jorge Jesus pode evidenciar algumas lacunas, em termos comportamentais e/ou nível do trato pessoal, mas denota uma perspicácia fora do comum na aplicação do “célebre losango”. As provas dadas no Sp. Braga, na última temporada, estão a ser confirmadas no Benfica actual, ao invés do que acontece com o seu homologo, no clube de Alvalade.
Numa táctica tão exigente como a escolhida, os médios não poderão estar somente limitados a desempenhar o papel de ligação entre os defesas e os homens mais avançados terão, forçadamente, de ser os principais responsáveis pela introdução da dinâmica, profundidade e flanqueamento do jogo da equipa.
À semelhança do que aconteceu no Sp. Braga, na época transacta, onde os vértices laterais do losango eram desempenhados por dois elementos com as características de flanqueadores (Alan e César Peixoto), Jorge Jesus conseguiu transportar para o clube da Luz a mesma filosofia e interpretação táctica, servindo-se com mestria da elevada cultura e disciplina de Ramires e das qualidades galvanizadoras do extremo-puro, que é Di Maria.
Contrariamente aquilo que se passa no clube encarnado e após quatro época a implementar o mesmo sistema de jogo, Paulo Bento, por teimosia ou inexperiência ainda não conseguiu entender que João Moutinho no vértice direito do losango e Vukcevic no vértice do lado oposto, não conseguem imprimir ao futebol do Sporting a dinâmica ofensiva e vivacidade requeridas por um futebol com aspirações. De facto, João Moutinho e Vukcevic, vocacionados para jogar mais como médios-centro dificilmente poderão interpretar o papel de “alas”, de forma a alargar a frente de ataque e libertar os ponta-de-lança das marcações cerradas a que estão sujeitos, de forma a tornar o futebol leonino mais eficaz e produtivo.
Face ao exposto, poder-se-á concluir que, não deverá ser a táctica a impor-se aos jogadores mas o inverso, tornando-se primordial escolher um sistema e um plano estratégico de jogo adaptados às qualidades dominantes dos principais elementos que constituem a equipa. O mesmo sistema táctico, que “fabricou” uma grande equipa, pode, com efeito fracassar se for servido por outros intérpretes.

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