segunda-feira, 26 de julho de 2010

Meu caro, Paulo Sérgio,

Embora acompanhe o futebol leonino, exaustivamente, há sensivelmente cinquenta anos, é a primeira vez que me dirijo, a um treinador do meu clube. E porque o faço?
Primeiro porque o seu passado, quer como futebolista quer como técnico, justificam admiração e respeito. Depois porque a forma frontal e digna como tem estado no futebol, merecem todo meu apreço. Também, porque gostaria de ver implementada, na equipa de futebol do Sporting, a mesma opção táctica-estratégia que na última temporada, foi a responsável pela brilhante campanha do Vitória de Guimarães.
Por último, penso que o meu passado sportinguista, me concede a legitimidade necessária e suficiente para, após ter visionado os encontros disputados, na fase de preparação para a temporada que se avizinha, tecer algumas considerações, prematuras talvez, acerca da equipa de futebol que se encontra em período de formação e de assimilação de novos métodos.
Não gostaria, no entanto, que as minhas palavras fossem interpretadas como intromissão na árdua tarefa que o espera, mas sim como um alerta para determinados casos pontuais que poderão ser importantes na diferença entre uma equipa ganhadora e outra, normalmente, arredada dos títulos.
Foi com satisfação que, ao presenciar os encontros realizados em Evian-les-Bains, constatei a total rejeição ao “malogrado losango” tão responsável pelos insucessos desportivos do futebol sénior leonino, nas últimas temporadas. Congratulei-me, igualmente, com a decisão do Paulo Sérgio tentar implementar um sistema táctico que contemple a presença de dois “alas bem abertos” (em 4x4x2 ou 4x3x3), de forma a dar profundidade ao jogo atacante da equipa, evitando o seu “afunilamento” e os paupérrimos espectáculos que os adeptos sportinguistas têm presenciado.
Na pré-época, os resultados pouco contam, mas servem sempre para moralização do grupo de trabalho e como não acontecem por mero acaso, ajudam para a identificação de desvios e imperfeições, bem como as respectivas correcções, afinações e adaptação dos novos elementos.
Também, tenho constatado que, o Paulo Sérgio tem optado, preferencialmente, pelo 4x4x2, esquema táctico que permite o flanqueamento do jogo, mas que obriga à presença de dois médios-centro, mais posicionais e com elevado sentido de marcação, com vista a libertar os médios-ala para as acções ofensivas de “linha de fundo”, que poderão representar “meio-golo” para os futebolistas que jogam de frente para a baliza adversária.
A aquisição mais sonante do presente defeso foi sem dúvida Maniche. Jogador experiente, na plenitude das suas capacidades físico-técnicas, chega ao Sporting evidenciando um espírito competitivo impressionante e uma “fome de bola” digna de um adolescente. No entanto, aos 33 anos, dificilmente suportará o desgaste de uma temporada a desempenhar as funções de médio-centro, com preocupações mais defensivas, num sistema 4x4x2. Maniche é um futebolista, tecnicamente evoluído, calhado na perfeição para fazer a ligação entre a defesa e o ataque (camisola nº 8), preferencialmente, num esquema de 4x3x3, uma vez que necessita da presença de médios com características defensivas que lhe “cubram as costas”, quando avança no terreno, no apoio aos avançados ou ensaiando o remate de meia-distância.
Com a titularidade de Maniche, quase assegurada, a utilização de um sistema 4x3x3, poderia “juntar o útil ao agradável” e, para além de elevar os índices de desempenho do jogador, contribuir para a resolução, de parte, do problema defensivo, manifestado pelo excesso de golos sofridos.
De facto, a exigência de um médio-centro-defensivo (Pedro Mendes) e a, eventual, colocação de Miguel Veloso a completar o trio de centro-campistas seria de primordial importância para o rigor defensivo, sabendo-se que, Miguel foi central de raiz e que o seu sentido posicional ajuda a “fechar” junto aos centrais. Já o trinco Pedro Mendes é, facilmente, adaptável a qualquer sistema táctico.
O chileno Valdês anunciado como extremo, para ambos os lados, evidencia uma mobilidade, poder de remate e excelentes pormenores técnicos que o denunciam como um médio-centro-ofensivo (camisola nº 10), vocacionado para o apoio ao ponta-de-lança, eventualmente, utilizável num tridente intermediário mais ofensivo. Quem, teoricamente, poderia desempenhar também essa missão seria o seu compatriota, Matias Fernandez, mas por deficiente adaptação ao futebol português ou por falta de capacidade para explanar a suas capacidades futebolísticas, vê o seu tempo em Alvalade, a esgotar-se.
Louvando, mais uma vez, a presença de dois médios-ala/extremos, o certo é que não têm surgido oportunidades de golo que conduzam a equipa a um elevado poder de concretização. Provavelmente, a justificação para tal facto, estará nos intervenientes, uma vez que, devido às carências existentes, no actual plantel, o Paulo Sérgio tem-se “desenrascado” com as adaptações possíveis.
No flanco esquerdo, Yannick Djaló é um jogador rápido, mas com características tipicamente para o contra-ataque e o seu sentido de baliza, “obriga-o” a flectir para dentro do terreno provocando o congestionamento da entrada da grande-área adversária e retirando profundidade e fluidez ao futebol praticado. Também, no flanco direito do ataque, acontece qualquer coisa de semelhante com a colocação de Simon Vukcevic, encostado à linha lateral. Jogador canhoto que, no salutar aproveitamento do seu poderoso remate e na tentativa de “aumentar” a dimensão da baliza adversária descai, com frequência, para a meia-lua, agravando o “tráfego” naquela zona, esquecendo-se da linha de fundo.
Com a ausência prolongada, por motivos físicos, de Izmailov e da provável saída de Yannick, aconselha-se a aquisição de dois extremos-puros. Talvez Sinama-Pongolle possa vir a ser solução alternativa, temporária, para um dos flancos.
A opção de jogar com dois elementos na frente de ataque, não tem resultado plenamente e o poder de concretização tem estado afastado. De facto, Hélder Postiga e Saleiro pouca eficácia têm demonstrado. Fortes fisicamente, de remate espontâneo e bons cabeceadores, teoricamente, possuem características ideais para a função e, talvez, por esse motivo não se completem. Em termos de produtividade, Hélder Postiga continua afastado dos golos, tendo entrado na “reserva de tolerância” em relação ao seu trajecto em Alvalade. Também Carlos Saleiro, com as oportunidades que lhe têm sido concedidas, evidencia ausência de “qualquer coisa” (será sal?) para poder singrar ao mais alto nível.
Também, não estou a “ver” Liedson, com a idade com que Cristo morreu, a “ressuscitar” para os golos e a lutar pela conquista “Bola de Prata”, uma vez que, encontra-se acomodado e com uma margem de “aceitação ao erro” ainda elevada, por parte dos adeptos sportinguistas.
Agradável surpresa tem sido o desconhecido Salomão, senhor de finta curta e de enorme confiança no um-para-um, aconselhando-se a sua entrada “a espaços”, no decurso da temporada. Também o jovem André Santos, depois de uma época plenamente conseguida em Leiria, espreita a titularidade se as opções técnicas, em temos de sistemas, se mantiverem.
Uma das questões mais problemáticas do plantel leonino encontra-se na posição de guarda-redes. Actualmente coloca-se um dilema, à equipa técnica. Ou continuar com Rui Patrício, “feito” na Academia, com compleição física quase perfeita para o lugar, mas que as quatro temporadas que leva como titular não têm reflectido uma evolução e acumulação de experiência consentâneas com os jogos disputados, ou apostar na aquisição de um novo “keeper” que, forçosamente, iria sentenciar o “final de carreira”, em Alvalade, do jovem guardião, à semelhança daquilo que aconteceu com Moreira, no Benfica, mas que poderia transmitir maior estabilidade e segurança ao sector mais recuado.
Em resumo, poder-se-á concluir que: Na zona defensiva, o clube encontra-se servido, com João Pereira e Evaldo a ocupar as laterais, mas com suplentes sem o mesmo nível futebolístico. De facto na direita, Abel, está na fase decrescente da sua carreira, mas sempre espreitando uma oportunidade de “ir a jogo”, pois a sua utilidade não se discute. Grimi, na esquerda, ainda não justificou a dispendiosa aquisição e com Evaldo como concorrente directo limitar-se-á a cumprir o contrato. No centro, Daniel Carriço, Polga e Tonel são garantia de qualidade e ambição de vencer. Torsiglieri e Nuno André Coelho terão de “mostrar serviço” que justifique a sua escolha como alternativa à zona central da defesa.
A zona intermediária terá, forçosamente, de ser reforçada, após o abandono de João Moutinho e a, iminente, saída de Miguel Veloso. Os dois trincos, Pedro Mendes e André Santos, embora de baixa envergadura física, poderão chegar para as “encomendas”. A adaptação de Nuno André Coelho, Daniel Carriço ou mesmo Tonel, à posição de médio defensivo, não parece viável, pois são jogadores “de ficar”, com rotina de centrais, não se adiantando no terreno com a oportunidade que é exigido a um trinco moderno do “tipo box to box”.
O ataque, não poderá estar dependente de um Liedson a caminhar para a veterania, de um Hélder Postiga perdulário, de um Saleiro pouco “condimentado” ou de um Sinama-Pongolle pouco imaginativo. Ou os avançados são mais eficazes e concretizadores ou, necessariamente, terá de se adquirir novos elementos.
Acredito na competência e capacidade do Paulo Sérgio para tomar as opções estratégicas mais consentâneas com as características dos futebolistas que formam o plantel do Sporting, de forma a conduzir o clube ao título que os adeptos tanto anseiam. Para o Paulo seria não só o reconhecimento das suas reais qualidades como o coroar de um trabalho profícuo e do qual, eternamente, se orgulharia.

Saudações leoninas do Luso.


Lisboa, 26 de Julho de 2010


PS: Se o tempo escassear e a paciência se mostrar insuficiente espero que, pelo menos, leia esta minha missiva no final da temporada retirando, obviamente tarde de mais, as devidas ilações.

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